Toda Garanhuns reverencia Seu Domingos
Liv Moraes, Elba Ramalho, Mariana Aydar, Guadalupe e Nádia Maia levaram ao público grandes clássicos do safoneiro pernambucano
Postado em: Festival de Inverno | Música
por Leonardo Vila Nova
Sabedoria, doçura, generosidade… esses são alguns dos inúmeros predicados ouvidos ontem sobre um dos mais admiráveis filhos de Garanhuns, e grande homenageado nesta última sexta-feira (18), segunda noite do Festival de Inverno de Garanhuns. José Domingos de Morais, o saudoso Dominguinhos, foi responsável pelas mais belas canções da música popular brasileira, um instrumentista reverenciado por todos aqueles que ele acompanhou em palco e nos estúdios, além de um ser humano grandioso aos olhos de quem o conheceu pessoalmente. A maior praça de Garanhuns, antes Guadalajara, hoje leva seu nome. Ontem, nesta mesma praça, e no mesmo palco onde ele já se apresentou por diversas vezes em vida, a cidade reverenciou este grande mestre, que hoje deixa saudades, mas, acima de tudo, um legado incontestável que abrilhanta a cultura brasileira.
Cinco mulheres em palco e um repertório todo baseado nas canções de Dominguinhos. Liv Moraes, Elba Ramalho, Mariana Aydar, Guadalupe e Nádia Maia emprestaram suas vozes a clássicos do mestre, hoje eternizados no cancioneiro popular brasileiro. Primeira a subir ao palco, Liv Moraes, filha de Dominguinhos, começou com “Eu só quero um xodó”, um dos grandes sucessos do pai. “Como músico ele nos ensinou muito, mas, como pai, ele deixou pra mim a honradez de caráter, a relação de humanidade e respeito para com os outros, mostrando sempre que as pessoas devem somar suas qualidades umas às outras, que ninguém faz nada sozinho. Compartilhar o melhor da vida com os seus e com quem está à sua volta”, disse Liv sobre o pai.
Palavras de carinho sobre Dominguinhos também tomaram de emoção a cantora Elba Ramalho, intérprete das mais assíduas de sua obra. “Eu tinha e tenho muito amor por ele. A gente tem muitas histórias juntos que ficam pra sempre na memória. Choramos e sorrimos muito juntos, eu compartilhei muito da minha vida com ele, quando eu passava algum perrengue, era pra ele que eu ligava. E, musicalmente, ele me presenteou com muitas canções que marcaram minha carreira. Ele é um exemplo de dignidade que serve pra todas as gerações de músicos”. Elba gravou 33 canções de Dominguinhos ao longo de sua carreira. Uma delas, não poderia faltar no show de ontem. “De volta pro aconchego”, música que mais representa essa fecunda parceria, comoveram a cantora e o público.
Guadalupe, viúva de Dominguinhos, também subiu ao palco e emocionou ao interpretar uma canção emblemática do mestre, com versos que querem dizer muito. “Tô com saudade de tu, meu desejo…” diz o início da letra de “Gostoso demais”, que fala, em versos doces, a falta que Dominguinhos faz. A forrozeira Nádia Maia também entoou canções do mestre, como “Quando chega o verão” e “Depois da derradeira”. A admiração e o respeito ao mestre eram evidentes ao falar de Dominguinhos. “Eu sempre fui fã de Dominguinhos e sempre quis estar junto dele. Quando me firmei como forrozeira, ele chegou mais perto, e eu pude ver e sentir o cuidado que ele sempre tinha com a gente do forró, dava dicas de como seguir nessa estrada. Aprendi muito com ele e toda a homenagem que seja feita sempre será pouca”, falou.
E, em clima de celebração, como não poderia deixar de ser, a música de Dominguinhos, que tanto animou e anima públicos Brasil afora, presente nesta homenagem, foi traduzida no maior espírito de festa. “Isso aqui tá bom demais” reuniu as quatro cantoras em palco (Elba precisou ir embora antes do fim do espetáculo), nesta noite em que Garanhuns reverenciou seu mestre com saudades, mas, principalmente, com muita alegria.
O olhar para além da música
A cantora Mariana Aydar, que também participou da homenagem a Dominguinhos, sempre teve uma relação muito próxima com ele. Sua mãe foi produtora do músico, e a jovem artista começou a carreira no forró, bebendo da fonte que, belamente, significa e traduz a obra de Seu Domingos. Seja ao falar sobre o mestre, ao interpretar suas canções, sobressalta aos olhos, ouvidos e à alma a ternura, admiração e respeito que ela devota a ele. “Dominguinhos é o maior gigante que eu já vi na música”, conta Mariana, ao ressaltar a importância que ele teve em sua vida. “Eu posso passar um bom tempo aqui falando de todas, absolutamente todas as qualidades musicais dele. Eu, que já cantei com ele me senti, literalmente, nas nuvens, sendo carregada para um outro lugar muito lindo. Eu pude estar ao lado de um gênio, extremamente humilde, pé no chão, igual a todas as pessoas. Algo raro ver em alguém que a genialidade não transforma ninguém melhor do que ninguém. E isso fez eu me apaixonar ainda mais por ele”, disse Mariana, com um brilho nos olhos.
Dividir o palco, as inspirações e as emoções com Dominguinhos ainda foi pouco para Mariana. Era importante e necessário ir mais além. E foi isso que a fez se unir a Eduardo Nazarian e Joaquim Castro para dirigirem o documentário “Dominguinhos”. Um recorte muito sensível e generoso da obra do mestre, que conta com participações do quilate de Hermeto Pascoal, Lenine, Gilberto Gil, João Donato, entre outros. “Ele era uma pessoa muito fácil de lidar e nesse processo do filme ele nos deu liberdade e nos permitiu que fosse possível dar a nossa visão a respeito dele. E uma das nossas maiores preocupações foi trazer à tona as canções mais lado B dele, que ele já não tocava há muito tempo”. E durante as filmagens, ela conta que todo um trabalho de pré-produção era armado, com a escolha das canções, elaboração das partituras para os convidados que se encontrariam com Dominguinhos para interpretá-las, sem ensaio prévio. Naturalmente, espontaneamente, tudo foi fluindo e se transformou no filme que entrou no circuito comercial de cinema.
“Dominguinhos” contará com uma exibição especial durante o Festival de Inverno de Garanhuns, dentro da programação de audiovisual. Será na próxima quinta, às 15h, no Cinema Eldorado. Os ingressos são gratuitos e podem ser retirados uma hora antes da sessão.



