Ave Sangria ressurge com novas canções no palco da música psicodélica
Quarenta e cinco anos depois do primeiro disco, banda apresentou no Guaiamum Treloso Rural cinco das onze músicas inéditas que estarão no álbum 'Vendavais', a ser lançado em abril deste ano
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‘O poeta’, ‘Sete minutos’, ‘Ser’, ‘Vendavais’ e o single ‘Dia a dia’ foram as músicas inéditas tocadas no palco do GTR
Por Marcus Iglesias
Quarenta e cinco anos depois de ter lançado o intrigante disco homônimo, a Ave Sangria ressurgiu no palco da música psicodélica apresentando canções do novo disco batizado de ‘Vendavais’ . No último sábado (9), durante o Festival Guaiamum Treloso Rural, em Camaragibe, o grupo – atualmente formado por Marco Polo (vocal), Paulo Rafael (guitarra), Almir Oliveira (violão), Juliano Holanda (baixo), Júnior do Jarro (bateria) e Gilú Amaral (percussão) – cantou e tocou para seus fãs cinco das onze músicas inéditas que estarão no álbum a ser lançado em abril deste ano.
‘O poeta’, ‘Sete minutos’, ‘Ser’, ‘Vendavais’ e o single ‘Dia a dia’, segundo Almir, foram as músicas inéditas apresentadas no palco do GTR. Sobre o novo single, que conta com um lyric vídeo disponível na internet, o violonista do Ave Sangria explica que é a primeira vez que a música foi gravada em estúdio, “mas em 1974 tocamos ela no Perfumes y Baratchos, no Teatro de Santa Isabel, e o registro daquele show ficou gravado numa fita k-7, transformado posteriormente em LP e CD, que foi até o Marco da Lata e o pessoal do Anjo Gabriel quem organizou pra gente”. A ilustração do single e da capa é assinada por Neilton Carvalho, ilustrador e guitarrista do Devotos.
“Naquela época, em 1974, nos éramos jovens e os mais velhos encarceraram nossa obra musical. Agora, em 2019, nós somos os mais velhos e os jovens nos libertaram desse cárcere. Foram eles que trouxeram a gente de volta. Então o que estamos fazendo é retribuir o que fizeram pela gente. Não houve mídia, empresário, nada disso. Foi a juventude, através da internet, que, fez isso aqui acontecer: um segundo disco, 45 anos depois de lançado o primeiro”, comemora o violonista do Ave.
Depois de anos sem tocar tantas músicas inéditas, havia uma expectativa por parte do público – e da própria banda – em relação à aceitação deste novo disco. “Você sempre fica, né? Eu acho que a reação foi muito boa. Lembro que quando a gente cantava uma música nova, as pessoas ficavam paradas, prestando atenção. E aos poucos elas iam começando a repetir vocalmente o que era um refrão de volta. Acho que o Ave Sangria cria um instrumento de conexão entre o público e o palco. Não é uma coisa solta, isolada. É conectada. E isso é muito bom, porque é uma das poucas bandas que quando canta alguma coisa todo mundo canta junto”, opina Marco Polo.
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Depois de anos sem tocar com frequência músicas inéditas, havia uma expectativa por parte do público – e da própria banda – em relação às músicas desse novo disco
“Ave Sangria é isso, uma banda que interage com as pessoas ao mesmo tempo em que brinca e critica tudo. A gente está num mundo extremamente reacionário, e a primeira vez que lançamos um disco foi em plena ditadura militar. Agora voltamos com um novo CD em pleno empoderamento da extrema-direita. Parece uma sina, uma necessidade da gente de quebrar o pau e dizer que a gente merece coisa melhor. É isso que o Ave Sangria faz”, filosofa o vocalista da banda, fazendo uma comparação entre os momentos políticos e sociais dos dois discos.
O convite para realizar a produção musical deste novo trabalho, conta Juliano Holanda, surgiu por conta da relação íntima que ele que tem com a banda enquanto músico e pessoa. “Sou amigo deles. Meu pai dividiu casa com Almir e Ana, que é filha de Almir, e minha amiga de infância. Brinco que Almir me cevou durante esse tempo, porque sempre convivi com a música do Ave Sangria. E quando houve convite, a princípio, era pra que eu me apresentasse apenas em um show no Teatro de Santa Isabel pra tocar baixo. Aquilo foi tomando um caminho natural de seguir fazendo as apresentações, mas não era a ideia do início”.
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“Há uma identificação musical e pessoal. Assim as coisas fluem de uma maneira muito singular, porque todo mundo participa das ideias que surgem”, explica Almir, sobre a atual formação da banda
A formação atual, com três músicos da expoente cena pernambucana (Juliano Holanda, Júnior do Jarro e Gilú Amaral) também foi se constituindo de forma natural. “(Júnior) Do Jarro já tocava bateria com eles, quando o Anjo Gabriel se apresentava antes do Paulinho voltar para a banda. Na verdade, era uma formação com o Anjo Gabriel, Almir e Marco Polo. E foi natural manter Júnior do Jarro na história. Gilú tem uma história bem diversa e conhecia bem o som deles. No final são três fãs que dão o sangue em cima do palco”.
Hoje, além de ter produzido o novo álbum, Juliano Holanda conta que, assim como Jarro e Gilú, também se sente parte da banda. ”Não é aquela coisa de músicos contratados. Todo mundo interage, e há uma cumplicidade e respeito e admiração mútua. Acho que esse show e o disco são muito fruto disso”. A mesma opinião é compartilhada pelo músico Almir. “Somos a mesma banda. O entrosamento é fundamental, tanto fora do palco com dentro. Há uma sintonia e felicidade muito grande. É na cozinha que está o tempero e a sustância”.
Marlon Diego/Divulgação

“Acho que o Ave Sangria cria um instrumento de conexão entre o público e o palco. Não é uma coisa solta, isolada. É conectada”, opina Marco Polo, vocalista do Ave
Almir detalha que não foram realizados tantos ensaios antes do show no Guaiamum Treloso Rural porque reunir a banda é uma verdadeira engenharia. E que o entrosamento visto entre os seis músicos no palco se dá simplesmente por conta da sintonia entre eles. “Há uma identificação musical e pessoal. Assim as coisas fluem de uma maneira muito singular, porque todo mundo participa das ideias que surgem. Uns tem mais experiência, outros estão vindo como novo gás e novas ideias. A mola propulsora está mais vibrante”, ressalta Almir.
Sobre o disco, Juliano explica que ele surgiu a partir de dois caminhos espontâneos: uma necessidade criativa dos artistas e também uma demanda do mercado fonográfico. “Quando a gente começou a se apresentar havia sempre o interesse de tocar músicas novas. E depois que estabelecemos uma parceria com a Sunset Produções, tivemos que ter um disco novo para justificar uma nova turnê”. Ainda segundo ele, o selo de lançamento está em negociação, mas a produção do novo CD foi feita de forma independente.
Na pré-produção, o Ave Sangria não sabia por onde começar. Havia em mãos um material de composições dos anos 80 e 90, e em paralelo o problema dos universos pós Ave Sangria: os antigos integrantes evoluíram para lugares muito distintos. “Ficamos um mês tentando harmonizar os três artistas até chegar numa opção. Depois de feito, parece que foi fácil, mas não foi. Descobrimos que eles tinham musicas inéditas não gravadas da época que eram uma banda e ensaiavam juntos na década de 70. Principalmente umas composições conjuntas de Almir e Marco Polo. Fomos atrás delas, e Marco tinha várias gravadas em k-7”, lembra Juliano Holanda.
Depois de um tempo discutindo sobre quais trilhas percorrer, a banda entendeu que seria interessante que o novo disco tivesse uma estrutura parecida com a do primeiro. “Criei então um processo que chamamos de Leis e Diretrizes, e a diretriz básica era que só teria no segundo disco o que tivesse no primeiro. Como se estivéssemos em 1974. E quando a gente viu o material era muito bom. Podia ter gravado um disco com 30 músicas, se quisesse”, brinca Holanda.
O disco foi gravado no Rio de Janeiro, no estúdio de Carlos Trilha, para criar uma situação que fosse semelhante a do primeiro. As músicas foram gravadas e mixadas de forma analógica, usando uma mesa SSL, no estúdio que foi do Legião Urbana. Todos os músicos gravaram as músicas juntos, cada um numa sala, e em dez dias o álbum estava pronto. “Acho que tem uma tônica muito forte em relação à produção do primeiro para esse, porque o anterior não teve muito tempo pra ser produzido, nem tanto cuidado e carinho como esse”, avalia o produtor musical. “Gravamos, na verdade, 13 músicas, e duas serão lançadas posteriormente como outros singles”, conclui Juliano Holanda.