Maestro Forró e Mário Filipe incentivam a criação artística no Outros Palavras
Na sexta-feira (11/05), o ETEPAM recebeu em seu auditório o EREM Nóbrega, EREM Clóvis Beviláqua e Escola Regueira para mais uma edição do Outras Palavras, que reuniu cerca de 300 alunos.
Postado em: Fundarpe | Secretaria de Cultura
Por Camila Estephania
Cerca de 300 alunos das instituições de ensino EREM Nóbrega, EREM Clóvis Beviláqua, Escola Regueira e ETEPAM se reuniram no auditório da última para participar da edição do Outras Palavras da sexta-feira (11/05), que teve como convidados o escritor Mário Filipe Cavalcanti e o Maestro Forró. Contando com a colaboração dos alunos da escola anfitriã que comandaram a parte técnica do evento, a edição do projeto, que é uma ação da Secult-PE/Fundarpe, ficou marcada pelo intercâmbio também entre os artistas e os estudantes que participaram ativamente de debates intensos.
O evento foi aberto por Antonieta Trindade, vice-presidente da Fundarpe e idealizadora do projeto. “Como nós achamos que os filhos dos trabalhadores merecem ter o mais amplo acesso ao conhecimento, criamos o Outras Palavras. É uma oportunidade de estar perto daqueles que produzem o que há de melhor na cultura pernambucana”, disse ela na ocasião. “Essa união entre Cultura e Educação já atingiu mais de 300 escolas e é um trabalho reconhecido por vários gestores da Secretaria de Educação, porque tem repercutido postivamente nas instituições. Acredito que essa integração é o que falta para que a gente possa ter uma educação pública de qualidade social e que possa garantir a nossa juventude a chance de ampliar o seu conhecimento e percorrer outros caminhos”, avaliou.
Rodrigo Ramos

A vice-presidente da Fundarpe, Antonieta Trindade, destacou o sucesso do projeto entre alunos e gestores de educação.
Ex-aluno do EREM Nóbrega, escola que participou desta edição, o escritor premiado Mário Filipe Cavalcanti deu um bom exemplo de como a arte não só contribui com qualquer formação como também pode ser uma alternativa profissional possível. “A vida no ambiente jurídico é uma vida burocrática e trabalha com a vida de outras pessoas, então, é um trabalho pesado que exige muito, mas não me rendo totalmente a isso. Como arte é algo que eu gosto de fazer, eu arrumo tempo . O tempo é elástico e você arruma quando quer. Há uma lista de grandes escritores que também tinham outras profissões. O Guimarães Rosa antes de ser diplomata também foi médico… Ele foi o representante do Brasil na Alemanha Nazista e dava passe para cá para quem o procurasse. Então, também há uma vida além da literatura”, exemplificou ele que, aos 26 anos de idade, também atua como advogado.
Questionado pela aluna Lívia, do EREM Nóbrega, sobre o que o inspirou para começar a escrever, o autor lembrou da importância da leitura. “Hoje se fala muito em oficina para escrever. Não tenho nada contra isso, mas o problema do Brasil não é de escrita, é de leitura. A leitura é o combustível da escrita”, observou ele que, durante a conversa, tentou levar novas referências para os alunos e citou vários autores, como Joseph Conrad, Mário Quintana, Tolstói, James Joyce, Machado de Assis, dentre outros, além de diferenciar tipos de narrativas como o romance, o conto e a crônica.
O autor ainda falou sobre as múltiplas interpretações que o mesmo texto pode despertar no interlocutor. “‘Alice no País das Maravilhas’, por exemplo, se você ler aos 5 anos, aos 15 e aos 30, ele vai ser coerente para todas essas idades. Mas também já reli várias vezes outros e fui entendendo mais, como ‘Metamorfose’, de Kafka, e ‘A Paixão segundo G.H.’, de Clarice Lispector”, disse ele. Sobre os seus próprios temas, esclareceu: “muita coisa que escrevo são a partir de experiências que eu passo e depois vou começando a mentir”, brincou ao lembrar de um conto inspirado pelas conversas de uma desconhecida ao celular no ônibus.
Para responder Taciana, do ETEPAM, sobre a pressão da família, aproveitou para encorajar os alunos: “se você quer muito alguma coisa, tem que fazer independente da vontade da família. A família tem disso, às vezes só reconhece o seu trabalho depois. Acho que a maior dificuldade que o artista pode passar mesmo é furar o balão do ego, porque depois que consegue um editor, produtor, muito artista esquece a arte”, disse ele. “Vir em uma edição em que a escola em que cursei o ensino médio estava presente foi fantástico, porque isso mostra que o artista pode vir de onde for e ir longe”, pontuou ele no final.
Rodrigo Ramos

Ex-aluno do EREM Nóbrega, Mário Filipe doou livros para sua antiga escola, representada pela diretora Andrea Vieira.
Dando continuidade ao debate, o Maestro Forró destacou que é preciso focar em maneiras viáveis de fazer arte e não nas dificuldades. “Muita gente se prende no passado ou no futuro. No passado não temos como mexer e o futuro não dá para prever, mas você pode fazer algo agora. A Bomba do Hemetério é um bairro que tem dificuldades como muita gente, então começamos nosso trabalho estudando e com pouco tempo a gente já era uma diferença naquele lugar. O agora é o mais importante. Escute seu coração e faça”, aconselhou ele, ao falar da experiência ao lado da Orquestra da Bomba do Hemetério, que tem 16 anos de atividade e hoje conta com 27 profissionais da comunidade.
“É difícil tirar alguém das drogas depois que ele já entrou lá, mas é possível evitar que jovens entrem nas drogas através de trabalhos como o da Orquestra, porque estamos oferecendo opções. E é da periferia de onde vem os gênios, como Chico Science e Luiz Gonzaga, por exemplo. Já sofremos preconceito pela nossa origem, mas isso é coisa de quem não conhece o trabalho. Se quiserem evitar o preconceito, não emitam opinião sobre o que vocês não conhecem”, disse ele ao falar sobre a repercussão do trabalho, que é bem aceito por onde passa.
Rodrigo Ramos

Maestro Forró também também lembrou de referências como Luiz Gonzaga e Hermeto Pascoal no trompete
Entre um assunto e outro, o Maestro tocou no trompete músicas de Luiz Gonzaga e Hermeto Pascoal, além de frevos. “Muita coisa não tem apoio, mas acredito que tudo depende primeiro de você, porque tem gente que tem todos os apoios e não faz nada. Apoio é importante, mas não garante nada, a força está na gente”, falou ele, que disse sempre estar planejando algo para a Orquestra da Bomba do Hemetério, que hoje viaja o mundo inteiro para apresentar o trabalho que mescla cultura popular e erudita. “Seguir essa linha artística foi um caminho que encontrei para superar a falta de oportunidades e a pobreza do lugar onde eu morava. O que eu fiz não foi ser rebelde, mas sim inusitado. Viver de arte é muito melhor, mas viver já é uma arte”, resumiu ele, ao responder sobre o que influenciou a sua “rebeldia artística”.
O músico se despediu do evento convidando o professor de matemática Walter, do ETEPAM, para recitar versos autorais, provando que a arte é imprescindível até mesmo para quem se dedica às ciências exatas. “Acho que foi uma experiência incrível trazer os dois artistas para a escola, porque mostra para os estudantes que o artista é uma pessoa comum e que ele também pode ser. A escola influencia muito o estudante, porque estamos aqui para a formação dele, mas ela tanto pode bloquear como pode incentivar o estudante. Esse projeto é um caso de incentivo muito grande, porque mesmo que o aluno não siga nenhuma arte, abre sua visão de mundo”, opinou a gestora do ETEPAM, Sandra Domitília.
“O dia de hoje foi muito especial, porque a gente teve um ex-aluno como convidado. Hoje Mário cresceu como pessoa, principalmente, e tem uma obra que está inspirando outros meninos. Ele está aí como um produto das escolas de referência, da educação interdimensional e é o resultado do nosso trabalho. Fico feliz de ver que hoje ele está contribuindo positivamente com a sociedade. Foi gratificante estar aqui hoje”, concluiu Andrea Vieira, que é diretora do EREM Nóbrega.



