Marcelo Peixoto lança livro no Mepe nesta terça-feira (19)
Ava Gardner Nunca Disse Te Amei é a terceira coletânea de contos do autor
Postado em: Literatura | Museu do Estado
Ao ler a indicação Contos Gays na capa do novo livro do pernambucano Marcelo Peixoto – Ava Gardner Nunca Disse Te Amei –, o leitor pode ser provocado por uma efervescente imaginação de sentidos. No entanto, esteja preparado: a fetichização e exotificação que frequentemente são associadas aos corpos gays não têm lugar na obra. Também não encontrará os estereótipos decorrentes das representações na mídia, que ao longo do tempo moldaram uma percepção distorcida da identidade gay reduzindo-a a aspectos eróticos. É necessário abandonar os preconceitos para ler Marcelo Peixoto e, ao mesmo tempo, libertar-se da estrutura formal das análises sintáticas e morfológicas. Nesse ato de inventar um novo modo de expressar o que raramente é dito, pelo menos na literatura, Marcelo nos envolve em suas tramas, ou melhor, na trama de seus personagens.
Publicado pela Editora Mirada, o livro teve um lançamento no Rio de Janeiro e agora chega a vez de divulgá-lo no Recife. A noite de autógrafos acontece nesta terça=feira (19), a partir das 19h, no Museu do Estado de Pernambuco (Mepe). Posteriormente o livro estará disponível para venda em alguns sites e também pode ser adquirido diretamente com o editor e produtor executivo do livro, Léo Asfora, pelo WhatsApp (81) 99379-7711.
O livro surgiu a partir de três contos já escritos por Marcelo, em períodos distintos, e que abordam a homossexualidade. “Quando reli os contos que tinha escrito percebi que eles poderiam formar uma ótima temática, especialmente considerando o momento de violência, principalmente contra pessoas que expressam livremente opiniões sobre sua sexualidade e que pagam um preço muito alto por isso. Vi que havia muitas coisas a serem ditas e muitas a serem conhecidas”, diz o escritor.
As quatro estações são marcos simbólicos na estrutura de Ava Gardner Nunca Disse Te Amei, que é o terceiro livro de contos de Marcelo. A sugestão poética da passagem do tempo é usada para organizar as memórias em torno das várias referências do autor, que reuniu textos de diferentes épocas e personagens: histórias que viveu, as que lhe foram contadas, outras que testemunhou e ainda aquelas que imaginou haver acontecido. Todas giram em torno de uma condição que acompanhou Peixoto ao longo de sua vida, sendo motivo de alegria e drama, prazer e sofrimento. Ava Gardner Nunca Disse Te Amei é um livro de contos gays, descrito exatamente assim em sua capa, para não deixar dúvidas para quem o procura nas prateleiras das livrarias.
“Existe ainda muito preconceito, inclusive em expor um livro gay na vitrine. Quando eu perguntava se havia livros gays ao entrar em uma livraria apontavam para uma prateleira apertada, pequena, com uns cinco livros. Mas em destaque, exposto na vitrine, nunca vi. Mesmo quando eu morava no Rio, nos últimos dez anos. Estou agora assumindo isso, tendo a coragem de mostrar para as pessoas o que elas vão ler”, conta Marcelo.
Ava Gardner reúne 16 contos que se desenvolvem a partir das histórias de personagens diversos: jovens, velhos, prostitutos, castos, decadentes ou glamourosos; de Paris, Rio de Janeiro, Recife e Nova Iorque. São amores que se concretizam, os sufocados, os reprimidos, os erotizados e os simplesmente fantasiados. Há amores fáceis e difíceis, verdadeiros e tóxicos, dos que podem até matar. O livro é escrito sem pudores, com doses certas de sarcasmo e ousadia.
É um livro que nos provoca ainda pela linguagem. Marcelo Peixoto faz uso do método literário que ficou conhecido como fluxo de consciência, quando as falas ou ideias dos personagens surgem descritas sem edição, linearidade, mas de forma muitas vezes desordenada tal como como os pensamentos nos acometem. Ao abdicar de uma linha ordenada de raciocínio as rupturas de sintaxe e de pontuação acontecem para permitir que, ao ler a história, o leitor penetre nessa consciência de fluxo ininterrupto das razão humana.
O resultado pode ser lido ainda como se Marcelo transferisse a linguagem da poesia para a prosa, um modo de contar por meio de silêncios. As ausências verbais também comunicam implicitamente. Isso se torna um exercício para o leitor, que ao longo das narrativas aprende a ler Marcelo Peixoto não apenas por meio das palavras, mas abrindo-se a novos sentidos, perspectivas e reflexões que, ao final, estimulam o entendimento de que a literatura pode ser – e é bela quando é – uma ferramenta de confronto e posicionamento político.
O escritor Raimundo Carrero já definiu sobre Marcelo: para o escritor, o conto não é apenas uma história, mas também uma experiência de linguagem. O professor Anco Márcio Tenório Vieira, no prefácio do livro, sentencia: “Essas limitações na expressão, seja na forma ou no conteúdo, exploradas pelo narrador, resultam ao longo desses 16 contos em um silêncio longo e inquietante; um silêncio entre palavras, frases, diálogos, parágrafos, ações e, sobretudo, entre o narrador e o leitor. Esse silêncio, de maneira explícita ou implícita, convoca o leitor deste livro a sair de sua posição passiva e se inscrever, como se também fosse narrador, nas tramas e ações puramente textuais que se desenrolam diante de seus olhos. É responsabilidade dele, o leitor, suprir as elipses e insuficiências linguísticas deste Ava Gardner Nunca Disse Te Amei”, analisa o professor.
Após lançar o livro em duas capitais brasileiras, Marcelo e seu editor, Léo Asfora, já consideraram uma versão em inglês. “Acredito que essa temática realmente desperta interesse em todo o mundo. Acho que isso é extremamente benéfico para contribuir com a disseminação de informações. É importante que as pessoas percebam que não se trata apenas de sofrimento e dor. Muitos dos contos são alegres. Afinal, pensar que os gays são apenas infelizes é um equívoco. Assim como qualquer pessoa de qualquer orientação sexual os gays também podem ser felizes. No entanto, o preconceito… O preconceito é algo que continua causando muita violência. Mesmo nos dias de hoje, por causa do preconceito, vidas são perdidas. E tudo isso por causa da escolha de orientação sexual de outra pessoa. Nunca consegui entender e aceitar isso”, desabafa Marcelo.
SOBRE O ESCRITOR – Marcelo Peixoto é recifense e escreve desde a juventude. Aos 17 anos de idade apresentou dois de seus poemas à poetisa Maria do Carmo Barreto Campelo de Mello que, reconhecendo a qualidade dos textos, compartilhou-os com um editor do Suplemento Cultural do Jornal do Commercio. Impressionado pela pouca idade e maturidade poética do escritor, o jornal publicou os poemas com destaque intitulados Dois Poemas de Marcelo Peixoto. Foi assim que estreou na poesia.
Ele cursou sociologia e política na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Participou do Movimento de Cultura da Ribeira em Olinda. Foi proprietário do bar Senzala, que se tornou um ponto de encontro da cena cultural do Recife e de Olinda. Também atuou no teatro no Recife e no Rio de Janeiro. Foi professor de desenvolvimento da criação na Organização Brasileira de Ensino Pedagógico e trabalhou na TV Educativa nos anos 1970. Em 1978, ao retornar para o Recife, criou o Baile dos Artistas, que completou 45 anos de existência.
Fez parte da equipe da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), período em que produziu diversos documentários na Massangana Multimídia, sendo premiado com Melhor Curta-Metragem Documentário por Axexe no Festival Nacional de Curitiba. Criou a Galeria Vicente do Rego Monteiro, também da Fundaj. Quando trabalhou no setor de artes plásticas atuou como curador em diversos projetos, como Espaço Aberto, Riscos e Rabiscos e Um Olhar sobre os Trópicos (exposição de artistas nordestinos realizada na cidade do Porto, em Portugal).
É autor dos livros: Pastor da Solidão (poesia), Ai, Quem Me Dera Beijar os Lábios de Dorothy Lamour (contos), Cemitério Canários (contos) e Solidão Quebrada (uma retrospectiva de sua poesia dos anos 1960 até 2010).
Serviço:
Lançamento do livro Ava Gardner Nunca Disse Te Amei (Editora Mirada), de Marcelo Peixoto – terça-feira (19), a partir das 19h, no Museu do Estado de Pernambuco (Avenida Rui Barbosa, 960, Graças. Telefone: (81) 3184-3110). Aquisição do livro pelo WhatsApp: (81) 99379-7711. Valor: R$ 40
