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Livro da Cepe conta a história da Soparia, a casa da música pernambucana nos anos 1990

Obra do jornalista José Teles fala da importância cultural do bar que funcionou no Pina

Leopoldo Conrado Nunes/Divulgação

Leopoldo Conrado Nunes/Divulgação

José Teles e Roger de Renor

A efervescência cultural pernambucana dos anos 1990, principalmente no campo da música, tinha um epicentro: a Soparia. A história do icônico bar de Roger de Renor, no bairro do Pina (Zona Sul do Recife), é contada pelo jornalista José Teles no livro Soparia: De Boteco a Palco de Todos os Sons. A publicação é lançada pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), nesta sexta-feira (6), às 16h, no Auditório Círculo das Ideias da 14ª Bienal Internacional do Livro de Pernambuco. No lançamento Teles e Roger participam do bate-papo Soparia: A Biografia de um Bar e de uma Cena, mediado pela jornalista Valentine Herold, editora-assistente do jornal literário Pernambuco (Cepe).
“Todo mundo que fazia arte baixava lá”, afirma Teles referindo-se à Soparia. De acordo com o autor, Chico Science (1966-1997) era um dos habitués da casa onde também passaram muitas outras pessoas da música – Otto, Silvério Pessoa, Maciel Melo, Sivuca, Hermeto Pascoal, Fagner e Herbert Vianna, por exemplo -, das artes plásticas e do cinema, seja para se apresentar, dar uma canja (sic), acompanhar shows, beber ou apenas conversar. Teles conclui que “no geral, a programação (do bar) acontecia na base da imprevisibilidade” e que “a maioria dos que frequentavam a Soparia nem se preocupava em saber o que rolaria por lá”. Quase todos confessaram que iam ao bar “para se encontrar com os amigos”.
Para resgatar a história Teles foi atrás não só dos famosos, mas de quem fazia o estabelecimento funcionar, como a produtora cultural Paula de Renor – irmã e braço-direito de Roger no negócio -, garçons;,seguranças, e frequentadores do bar. E o que se vê nas 212 páginas do livro, com cerca de 50 imagens, é resultado de dezenas de entrevistas, pesquisas em jornais antigos e em trabalhos acadêmicos, além de análise de material de divulgação do bar e de fotografias.
A Soparia foi aberta por Roger de Renor em 1992. Começou a funcionar sem a pretensão de ser o que se tornou. Alguns fatores contribuíram para se transformar em referência cultural. Um deles, as frequentes canjas (sic) dadas por Lula Cortês, músico já consagrado. “Tocar num lugar onde uma lenda da música pernambucana se apresentava tornou-se objeto de desejo para qualquer jovem músico. E não apenas de Pernambuco”, diz no livro. Outro fator foi a Maré de 73 Lançamentos, como ficou conhecida a “histórica noitada mangue, que ocorreu no dia 14 de novembro de 1992, com Mundo Livre S/A e Chico Science & Nação Zumbi”. Além da apresentação das duas bandas, o evento contou com exibição de clipes e de um documentário chamado Mangue, chancelando a Soparia como a casa da nova música pernambucana. A partir daí subiram ao palco grupos como Mombojó, Mestre Ambrósio, Cascabulho, Comadre Florzinha, Paulo Francis Vai pro Céu e Querosene Jacaré.
Em 25 de março de 1999 o bar encerrou as atividades. O fechamento atraiu milhares de pessoas. “Tanto pelo bota-fora como pelo sucesso que fazia na cidade a principal atração, Cordel do Fogo Encantado”, destaca Teles. Após virar a noite, no dia seguinte Roger fechou o ciclo do bar. Baixou a porta e pichou “Cadê a Sopa?”, a frase mais ouvida ao longo da história do estabelecimento, que não servia apenas música, mas também sopa aos amantes da noite.
Para Teles, Roger “aproveitou o timing perfeito” para fechar a Soparia. E não fez isso por falta de público. “Se fosse por frequência a maioria dos donos de bar teria continuado até a fonte secar”, avalia. Sobre isso Roger afirma, em entrevista para o livro, que a badalação sobre a Soparia aumentou após a morte de Chico Science, ocorrida em 2 de fevereiro de 1997, atraindo novos negócios para o Polo Pina e, consequentemente, mais pessoas e problemas. “Começou a chegar uma galera pesada para o local. Eu entendo de juntar gente por meio da música. As pessoas que estavam vindo ali não fui eu que juntei. Foram trazidas por telefone sem fio. Era outra coisa. Aí resolvi fechar enquanto estava em cima. Quando as pessoas entendessem [o que tinha mudado] já teria queimado meu filme”, diz Roger.
O livro não se limita à história da Soparia. Teles aponta os bares da época do Soparia e de décadas anteriores. Dos anos 1970, por exemplo, lembra do Beco do Barato, no qual inicialmente passaram sambistas cariocas – Clementina de Jesus, Cartola, Zé Keti, Nelson Cavaquinho, Grande Otelo – e posteriormente virou referência para a psicodelia pernambucana, o chamado udigrudi. Dessa turma, o Beco do Barato recebeu apresentações de Flaviola e das bandas Tamarineira Village (futura Ave Sangria) e Phetus. Sobre os arredores do Soparia, nos anos 1990, o livro resgata dados de bares como o Satchmo, localizado na Galeria Joana d’Arc, o Oficina Mecânica e o Boratcho.
Teles adianta que o livro não lista todos os bares contemporâneos do Soparia. “Mas quem não a viveu terá uma ideia do que foi a Soparia. No Recife nunca teve um bar feito a Soparia. Acho que nem no Brasil. O bar foi alto e baixo astral, Woodstock e Altamont ao mesmo tempo”, pontua. Nele cabia diferentes vozes e ritmos. E Soparia: De Boteco a Palco de Todos os Sons retrata bem o espaço democrático e aparentemente caótico do bar que mereceu as páginas do New York Times em 1997 e 2001. Não por acaso a Soparia tinha uma atmosfera própria, uma cenografia única, com sua radiola de ficha, o cachorro de gesso, o quadro da sereia e seu inconfundível sofá vermelho.

Serviço:

Lançamento do livro Soparia: De Boteco a Palco de Todos os Sons, de José Teles - sexta-feira (6), às 16h, no Auditório Círculo das Ideias da 14ª Bienal Internacional do Livro de Pernambuco (Centro de Convenções, Olinda). Preço do livro: R$ 50 (impresso) e R$ 20 (e-book)

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